A Perícia Forense em face à Legislação

Os trabalhos que envolvem a Perícia Forense Digital devem estar suportados pela Legislação, uma vez que ações equivocadas, seja nos trabalhos de campo, seja no desenvolvimento do Laudo Pericial, podem ser comprometidos e prejudicados se estes não estiverem em perfeito alinhamento com as Leis que estão intimamente ligadas ao exercício deste trabalho, que tem como propósito fundamental a apresentação da verdade na forma juridicamente válida.

A seguir apresento os principais pontos em relação às leis a que os Peritos devem se atentar, no sentido de se encontrar o formato ideal para o uso da tecnologia sob a luz da legislação para as atividades da Perícia Forense Digital.

Constituição Federal

Todo conteúdo da Constituição Federal é importante para todo cidadão, porém o foco que desejo apresentar está relacionado aos aspectos que comumente vivenciamos nos processos judiciais, onde cabe a troca de informações com os colegas Peritos e os operadores do Direito.

Do Capítulo I da Constituição Federal, que se inicia pelo Art. 5º, lemos a seguinte declaração no inciso X:

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Este inciso aplica-se, por exemplo, ao típico cenário de publicações em redes sociais, onde os usuários por vezes violam a intimidade alheia, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, não observando que estão violando a Constituição Federal neste inciso, que pode ter como consequência um processo judicial, culminando em indenização por dano moral e/ou material.

No inciso XII, o legislador declara:

XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;

Este inciso aplica-se ao cenário em que a produção de provas não tem suporte jurídico, como por exemplo a obtenção de artefatos digitais do WhatsApp sem autorização judicial, situação em que as provas estarão prejudicadas.

O sigilo profissional está resguardado como cláusula pétrea no artigo 5º, incisos XIII e XIV da Constituição Federal, que prevê:

XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;

XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;

A violação do sigilo profissional pode ser caracterizada quando, em um processo judicial, uma das partes apresenta uma cópia de oferta de honorários Periciais de outro processo, em contraposição à proposta apresentada pelo Perito Judicial, não tomando a devida precaução de resguardar o sigilo da fonte. Infelizmente é uma prática comum que, se observado pelo Perito, este pode até solicitar ao Mm. Juízo para que seja oficiado o Órgão de Classe da parte que tenha supostamente violado o sigilo profissional, para verificar se este está incorrendo em ação que fere o código de ética do Órgão de Classe. Esta situação é agravada se o documento apresentado é, também, oriundo de um processo que corre em segredo de justiça, cenário em que o Perito observa a quebra do segredo de justiça.

Código de Processo Civil - Lei nº 13.105

O Código de Processo Civil é a lei que contém todas as normas relacionadas aos processos judiciais de natureza civil. No âmbito da Perícia Forense Digital, várias seções devem ser observadas para que se trabalhe a produção de provas de forma juridicamente válidas. O Perito é declarado como Auxiliar da Justiça no Art. 149.

A seção II do Código de Processo Civil trata exclusivamente Do Perito dos Art. 156 ao 158. Cabe a este a estrita observância da legislação, de forma a proporcionar contribuição saudável à Justiça, uma vez que suas obrigações estão estabelecidas nessa seção, assim como as penalidades a que o Perito esta sujeito, citada no Art. 158 em que o legislador prevê:

Art. 158. O perito que, por dolo ou culpa, prestar informações inverídicas responderá pelos prejuízos que causar à parte e ficará inabilitado para atuar em outras perícias no prazo de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, independentemente das demais sanções previstas em lei, devendo o juiz comunicar o fato ao respectivo órgão de classe para adoção das medidas que entender cabíveis.

O Perito deve dar atenção à Seção III, que trata Da Ata Notarial, no Art. 384 em que o legislador prevê:

Art. 384. A existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou documentados, a requerimento do interessado, mediante ata lavrada por tabelião.

Parágrafo único. Dados representados por imagem ou som gravados em arquivos eletrônicos poderão constar da ata notarial.

Dado que o Tabelião tem Fé Pública, quando o Perito necessitar juntar provas oriundas de redes sociais, por exemplo, ou de outros recursos da rede mundial de computadores, torna-se mandatório que os fatos sejam extraídos mediante um Tabelião, que lavrará Ata que dará autenticidade ao fato. Telas capturadas da internet e levadas diretamente ao processo judicial não terão muito valor probatório.

A Seção X trata Da Prova Pericial, do Art. 464 ao 479. Especial atenção deve ser dada ao Art. 473, que especifica o conteúdo esperado em um Laudo Pericial e como o Perito deve atuar. O legislador definiu o Art.473 dessa forma:

Art. 473. O laudo pericial deverá conter:

I - a exposição do objeto da perícia;

II - a análise técnica ou científica realizada pelo perito;

III - a indicação do método utilizado, esclarecendo-o e demonstrando ser predominantemente aceito pelos especialistas da área do conhecimento da qual se originou;

IV - resposta conclusiva a todos os quesitos apresentados pelo juiz, pelas partes e pelo órgão do Ministério Público.

§ 1o No laudo, o perito deve apresentar sua fundamentação em linguagem simples e com coerência lógica, indicando como alcançou suas conclusões.

§ 2o É vedado ao perito ultrapassar os limites de sua designação, bem como emitir opiniões pessoais que excedam o exame técnico ou científico do objeto da perícia.

§ 3o Para o desempenho de sua função, o perito e os assistentes técnicos podem valer-se de todos os meios necessários, ouvindo testemunhas, obtendo informações, solicitando documentos que estejam em poder da parte, de terceiros ou em repartições públicas, bem como instruir o laudo com planilhas, mapas, plantas, desenhos, fotografias ou outros elementos necessários ao esclarecimento do objeto da perícia.

A aceitação pelos especialistas, citado no inciso III do Diploma do Código de Processo Civil, implica que o procedimento especificado no laudo do Perito precisará merecer caráter técnico irrefutável aonde quer que este seja avaliado por outros colegas Peritos da área de conhecimento.

Todos os exames realizados devem ter o compromisso único com a verdade, sendo que o Perito cumpre um dever fundamental e primordial como “longa manus” do Juíz, cujo compromisso único é trazer o entendimento e a verdade real dos fatos ao Mm. Juízo.

Marco Civil da Internet- Lei nº 12.965

O Marco Civil da Internet é uma lei que foi criada no sentido de orientar os direitos e deveres dos usuários, provedores de serviços e provedores de conteúdo, e demais envolvidos com o uso da Internet no Brasil. O Marco Civil da Internet é o nome popular da lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014. É a lei que estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil.

Muita confusão se faz nos processos judiciais pela falta de entendimento quanto aos provedores de conteúdo e provedores de conexão, talvez pelo fato de exagerada terminologia técnica para tentar defini-las. Vamos tentar deixar essas diferenças um pouco mais claras, deixando as terminologias técnicas de lado.

O provedor de conexão é aquele que provê a conexão à internet. Por exemplo, se você acessa a internet pelo seu telefone celular, sua operadora é o provedor de conexão. Da mesma forma, em sua casa ou na sua empresa você contratou um serviço de internet, que muitas vezes vem com serviços combo como TV por assinatura. Essa empresa que instalou os equipamentos em sua residência/empresa e lhe proveu acesso à internet é o provedor de conexão.

O provedor de conteúdo é secundário, ou seja, você somente tem acesso a ele se tiver um provedor de conexão que lhe proveu acesso à internet. Uma vez com acesso à internet, você pode ter acesso aos provedores de conteúdo como as redes sociais, serviços de correio eletrônico, serviços de hospedagem do seu site, entre outros.

Nos processos judiciais, é comum verificarmos pedidos de informações pessoais aos provedores de conteúdo, como uma rede social, quando se deseja identificar a autoria de um ilícito. Ocorre que o provedor de conteúdo somente conseguirá entregar as informações de endereço IP e as portas lógicas utilizadas para acesso aos serviços, ou seja, ao conteúdo.

De posse da informação do endereço IP e as portas lógicas de acesso ao conteúdo, o provedor de conexão pode determinar a autoria do ilícito com as informações pessoais do dono daquele endereço IP.

A Seção II do Marco Civil da Internet trata Da Proteção aos Registros, aos Dados Pessoais e às Comunicações Privadas. Aos usuários são garantidos a inviolabilidade da intimidade e da vida privada, inviolabilidade e sigilo do fluxo de suas comunicações pela internet, e inviolabilidade e sigilo de suas comunicações privadas armazenadas, salvo por ordem judicial.